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CASO BRINER

Morte de jovem inocente dentro de presídio completa 2 anos sem conclusão de inquérito

10 outubro 2024 - 09h46

A morte do motoboy Briner de César Bitencourt, de 23 anos, completa dois anos nesta quinta-feira (10). Nesse período, a investigação sobre o caso não teve conclusão e a família ainda busca por justiça e responsabilização pela omissão de socorro ao jovem.

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Preso injustamente por um ano, o jovem morreu na madrugada do dia 10 de outubro de 2022 após passar mal dentro da Casa de Prisão Provisória (CPP) de Palmas. Ele foi inocentado da acusação que o levou para a prisão dois dias antes, mas o alvará de soltura, por atraso do Judiciário, só saiu no dia em que ele perdeu a vida.

A morte de Briner ganhou repercussão nacional por ele ter passado um ano preso e ser inocentado apenas quando já estava em péssimas condições de saúde dentro da unidade prisional.

O Ministério Público Estadual foi questionado sobre a situação e não deu posicionamento até a publicação desta reportagem. Sobre o inquérito sem conclusão, a Secretaria da Segurança Pública do Tocantins (SSP) informou, em nota, que o caso continua em andamento devido à complexidade da situação. (Veja nota na íntegra no fim da reportagem)

Passados dois anos e após a 'poeira baixar', quem lida diariamente com a dor e a necessidade de ter que seguir em frente é a família de Briner.

Élida Pereira da Cruz Dutra, mãe de Briner, conversou com o g1 e relatou como têm sido esse período sem o filho. Também falou sobre o quanto é dolorosa a espera da conclusão do inquérito policial e de ter que ver o arquivamento de sindicância contra os servidores que trabalhavam no presídio e que, segundo ela, não prestaram socorro ao filho enquanto ele passava mal.

Conforme laudo pericial, o jovem morreu em decorrência de problemas pumonares - tromboembolismo pulmonar, infarto pulmonar, Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica (SIRS) e pneumonia bacteriana.

"A gente sente muita falta, muita saudade. A dor da injustiça é muito grande. Acordar todas as manhãs, às vezes à noite, antes de dormir, e se lembrar do seu filho, saber que ele sofreu. Eu pensando hoje que nós jamais imaginaríamos que o próximo velório ia ser o dele, ainda mais em um caso de injustiça", lamentou a mãe.

Mãe de Briner se acorrentou no pilar de uma secretaria durante protesto em 2023  Foto: Aurora Fernandes/TV Anhanguera

Mãe de Briner se acorrentou no pilar de uma secretaria durante protesto em 2023 — Foto: Aurora Fernandes/TV Anhanguera

Mesmo tendo a consciência de não deu tempo de provar a inocência de Briner antes de sua morte, Élida acreditava que o filho poderia ter uma vida normal após sair da prisão, mesmo considerando esta uma experiência traumática.

"Depois de passar um tempo lá ninguém sai tão bem, mas ia seguir a vida dele. Trabalhar, seguir a vida dele, ter os sonhos dele. Ele tinha sonho de montar uma loja. E aí eu fico pensando que não tivemos nada disso, né? Por quê que essa maldade é tão grande no ser humano?", refletiu, já que acredita que o filho morreu sem nenhum apoio dos servidores da unidade.

Em abril de 2023, a Secretaria de Cidadania e Justiça (Seciju) arquivou a investigação sobre as circunstâncias da morte do motoboy, já que não identificou nenhum indício de infração disciplinar ou ilícito penal, conforme dispõe o Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado do Tocantins.

Para enfrentar os dias sem a presença de Briner, Élida disse faz tratamento psicológico. Mas a dor de perder um filho vai acompanhá-la 'até o último suspiro', conforme expressou ao falar do luto sem fim.

"Seguir minha vida entre aspas, faltando um pedaço, porque a gente perde um filho, a gente perde um pedaço da gente também. Eu considero assim, um pedaço de mim morreu naquele dia [...] Tendo que suportar tudo isso, respirar fundo e seguir toda estraçalhada, toda quebrada. E seguir, isso que é o mais doloroso, sabe". afirmou.

No dia em que completa dois anos da morte do filho, Élida e a família devem visitar o túmulo de Briner nesta quinta-feira.

Defesa quer conclusão

A advogada da família de Briner, Lívia Machado, afirmou que a defesa não teve acesso à investigação e segue aguardando um desfecho. "Mesmo já tendo esse lapso temporal de dois anos, infelizmente ainda não se conseguiu concluir essas investigações. O inquérito policial encontra-se em sigilo e a defesa não tem acesso a quais produções de provas já foram realizadas e quais diligências ainda faltam concluir para poder, enfim, se encerrar", explicou.

Como a família de Briner também entrou com um pedido na justiça de indenização do Estado, já que o jovem estava sob responsabilidade do Sistema Prisional quando passou mal e morreu, o processo segue em andamento.

"Por conseguinte, o juiz determinou que as outras partes apresentassem contestação e essas defesas já foram apresentadas. Nesse momento a gente aguarda o juiz marcar um audiência de instrução e julgamento para se produzir as provas em audiência, as provas testemunhais", informou a advogada.

Socorro a Briner levou pelo menos 30 minutos entre alerta dos detentos e chegada de policiais penais, segundo imagens  Foto: Reprodução

Socorro a Briner levou pelo menos 30 minutos entre alerta dos detentos e chegada de policiais penais, segundo imagens — Foto: Reprodução

Relembre

Briner foi preso em outubro de 2021 pela acusação de tráfico de drogas durante uma batida policial na casa onde alugava um quarto. Todo o tempo em que ficou preso, tentou provar sua inocência. Antes de ir para a prisão injustamente, ele trabalhava como entregador por aplicativo e fazia vídeos para as redes sociais sobre a rotina como como motoboy.

Na prisão ele passou a sentir dores pelo corpo e segundo a Seciju, o quadro de saúde piorou na noite de domingo, dia 9 de outubro, para segunda-feira, dia 10. Ele foi levado para uma UPA da capital, mas não resistiu.

A sentença que determinou a inocência do jovem saiu no dia 7 de outubro, mas ele estava na unidade penal porque ainda não tinha um alvará de soltura. O documento só saiu no dia 10 de outubro, mas Briner já estava morto.

O Tribunal de Justiça foi questionado sobre o atraso na liberação do alvará de soltura e por nota informou que o processo obedeceu ao trâmite normal, 'sem qualquer evento capaz de macular ou atrasar o andamento do feito'. Depois da repercussão do caso, o Tribunal de Justiça Tocantins assumiu que houve falha no processo.

Briner adoeceu na prisão, mas a família do motoboy nunca recebeu informações sobre o estado de saúde dele. Segundo a Seciju, a pasta seguiu protocolo e isso ocorreu "devido ao sigilo médico/paciente, os atendimentos realizados durante à custódia não são informados". Depois da repercussão, a pasta informou que criaria uma comissão multidisciplinar para reavaliar os protocolos de comunicação à família. O laudo da morte do motoboy foi concluído pela Polícia Científica em novembro de 2022.

Vídeos internos da unidade mostraram que os detentos bateram nas grades das celas para alertar os policiais penais e servidores que o jovem não estava bem. O socorro só veio quase uma hora depois.

O que diz a SSP

A Secretaria da Segurança Pública do Tocantins informa que o inquérito relacionado ao caso em questão continua em andamento. Devido à complexidade da situação, a investigação requer uma análise detalhada de diversos elementos para a elucidação das circunstâncias do fato. Vale ressaltar que as autoridades estão empenhadas em esclarecer todos os aspectos envolvidos, garantindo que o inquérito seja concluído o mais breve possível. Mais informações serão repassadas em momento oportuno.

*G1 Tocantins